«Poetisas na Grécia antiga», por Leonor Santa Bárbara (Universidade Nova de Lisboa), 26 de Setembro de 2019
Pensar na literatura da Antiguidade é pensar numa escrita masculina, mesmo que possa representar situações e sentimentos femininos. No entanto, isso não impede que encontremos algumas escritoras, como sucede na Grécia. Na poesia destacam-se duas figuras, que viveram em diferentes épocas: Safo e Ânite. A primeira – a mais conhecida – natural de Lesbos, viveu no século VI a. C. Apelidada por Platão de “décima Musa”, escreveu uma grande quantidade de poemas líricos, dos quais apenas nos chegaram sobretudo fragmentos. Dela se sabe que dirigia um tíaso, cujo objectivo seria preparar as jovens para o casamento. Já de Ânite de Tégea se sabe menos. Tendo vivido pelo século III a. C., o pouco que dela se conhece são alguns epigramas na Antologia Grega. As suas temáticas variam entre descrições da natureza, poemas campestres e poemas fúnebres ou de carácter religioso. Partindo dos poemas que nos chegaram, procuraremos mostrar como estas duas mulheres, que viveram separadas pelo tempo em sociedades distintas, imprimiram à sua poesia delicadeza e sensibilidade, permitindo-nos ter uma imagem, por pequena que seja, da mulher grega.
Leonor Santa Bárbara: É Doutora em Literatura Grega e Professora Auxiliar na NOVA FCSH, onde ensina Grego, Literatura Grega e Cultura Clássica Grega na licenciatura de Estudos Portugueses. Tem ainda a cargo o seminário de Matrizes Clássicas da Cultura Portuguesa, do Mestrado de Ensino do Português no 3.º ciclo do ensino básico e no ensino secundário e do Latim no Ensino Secundário. É investigadora do CHAM–Centro de Humanidades desde 2013. Os seus interesses integram-se na área da cultura e da literatura gregas antigas, sobretudo o período helenístico. Tem várias publicações nacionais e internacionais, entre as quais se destacam traduções para Português tanto de estudos relativos à cultura e literatura gregas (E. R. Dodds, E. Havelock, Jacqueline de Romilly e Félix Guirand) como de textos gregos e latinos (epigramas da Antologia Grega relativos aos temas do amor e da morte; colaboração na tradução de D. Jerónimo Osório, De Gloria), a par de outras colaborações, sejam artigos ou capítulos de livros.
«D. Maria Constança da Câmara, marquesa de Fronteira: a escrita íntima», por Pedro Urbano (Universidade Nova de Lisboa), 31 de Outubro de 2019
D. Maria Constança da Câmara é uma ilustre desconhecida para o grande público, tendo nascido em 1801, em Lisboa. Descendente do navegador João Gonçalves Zarco e aparentada com a alta aristocracia portuguesa, casa com o 7º marquês de Fronteira, D. José Trasimundo Mascarenhas Barreto. Fruto da situação política em Portugal e das opções políticas deste, embarcam a partir de 1826 numa viagem pela Europa, da qual resulta na escrita de um diário, com 25 anos de idade. Este diário, até ao momento inédito, seria escrito de forma mais prolixa até 1833 dando conta dos diversos países visitados – Inglaterra, França, Suiça, Itália, Áustria e Alemanha; da elite social e artística do seu tempo, mas também os seus consumos culturais, bem como a conjuntura política nacional, permitindo uma visão do quotidiano feminino da primeira metade do século XIX na primeira pessoa.
Pedro Urbano: Doutorado em Ciências Históricas pela NOVA-FCSH, cuja tese financiada pela FCT venceu a 23.ª edição do Prémio Victor Sá de História Contemporânea da Universidade do Minho. É investigador integrado do IHC e investigador convidado do CEC-FLUL, tendo participado em diversos projectos de investigação em várias universidades portuguesas como Portuguese Women Writers e Site Escritoras, bem como em redes europeias de investigação, nomeadamente as COST Action Women Writers in History e Reassembling the Republic of Letters, 1500-1800. Obteve financiamento no CEECIND 2017 com o projecto Women (e)go: nineteenth century Portuguese female self-writing.
«Maris Ceh Moo: reafirmação étnica numa escritora indígena latino-americana», por Juciene Ricarte Apolinário (Universidade Federal de Campina Grande), 21 de Novembro de 2020
Mergulharemos nas histórias, memórias e legados das literaturas escritas por uma escritora Indígena da América Latina, Maris Ceh Moo. Maris Ceh Moo é mexicana, escreveu X-Teya, u puksi’ik’al ko’olel (Teya, un corazón de mujer), que foi o primeiro romance escrito em idioma maia. O livro foi publicado numa edição bilíngue pela Dirección General de Culturas Populares (México), com a versão em maia e em castelhano. Antes das produções literárias de Maris, as publicações em língua maia só haviam trazido narrativas curtidas, como o conto, o poema, o mito e as lendas. Marsiol Ceh Moo queria mais liberdade com os personagens, tempos verbais e contextos. Teya, un corazón de mujer é o primeiro romance escrito por uma mulher em um dos idiomas indígenas do México e narra o assassinato de um militante comunista em Yucatán (México). A autora recebeu por essa narrativa o reconhecido Premio Nezahualcóyotl de Literatura en Lenguas Mexicanas. Procuraremos em nossas discussões contribuir para uma luta Internacional que é dá visibilidade e protagonismos às mulheres indígenas, especialmente enquanto escritoras de obras literárias que possibilitam reafirmar as suas etnicidades.
Juciene Ricarte Apolinário: Possui graduação em História pela Universidade Estadual da Paraíba (1993), mestrado em História do Brasil pela Universidade Federal de Pernambuco (1996) e doutorado em História pela Universidade Federal de Pernambuco com Bolsa da CAPES no Brasil e no Exterior (Portugal -Universidade do Porto) (2005). Participou como pesquisadora de tratamento arquivístico e histórico do Projeto Resgate Barão do Rio Branco/MINC durante nove meses em Portugal com Bolsa do CNPq de Aperfeiçoamento no Exterior e Bolsa da Sociedade Goiana de Cultura. Atualmente é professora adjunta da Universidade Federal de Campina Grande – PB. Professora Dra. do Programa de Pós-Graduação em História da UFCG (Mestrado). Desenvolve projeto histórico-documental Catálogo Geral de Documentos de História Indígena e Escravidão Negra financiado pela Petrobrás. Publicou livros individuais e em coletâneas. Ë investigadora correspondente do Centro de História de Além-Mar , Lisboa – PT. Tem experiência na área de História, com ênfase na História do Brasil Colonial e Imperial: atuando principalmente nos seguintes temas: História Indígena, História Ambiental , Questões Étnicas, Escravidão Negra, Patrimônio Cultural, Patrimônio Documental, Cultura e Identidade.
«Mulheres nos primórdios da literatura infantil brasileira e portuguesa», por Patrícia Santos Hansen (Universidade Nova de Lisboa), 30 de Janeiro de 2020
A história da literatura infantil na Europa e na América demonstra que os livros para crianças, desde sua popularização no século XIX, têm sido objeto de grandes investimentos editoriais e comerciais. Poderosos veículos de representações sociais e políticas, tornaram-se o tipo de impresso mais sujeito à censura, oficial ou não, podendo ser exercida em diversos momentos entre a produção do livro e a sua recepção pela criança-leitora. No Brasil, os homens tiveram mais destaque na produção da literatura infantil em seus primórdios, com poucas exceções. Portugal contou com maior presença feminina na edição, escrita, ilustração e em outras fases do ciclo de vida do impresso infantil. Ao investigarmos as fontes, percebemos que diferenças de gênero na autoria se refletem nas escolhas temáticas e em distintas representações do masculino e do feminino. Do ponto de vista das trajetórias intelectuais, cabe inquirir a função da relação mulher-criança naquele contexto, para a construção da identidade intelectual de mulheres que se dedicaram à literatura infantil. Seja como um fator hierarquizador de autoridade, atividades e bens culturais resultantes, seja como elemento componente de uma identidade e lugar social a ela correspondente. Embora muitos intelectuais reconhecidos tenham se dedicado a escrever para crianças, e a maioria dos “gênios” da literatura infantil seja do sexo masculino, há uma percepção difusa dessa atividade como feminina e de pouco valor intelectual. Nas palavras de Eça de Queirós: “senhoras inteligentes e pobres se poderiam empregar em escrever essas fáceis histórias” (1881). Eça nunca se arriscou a escrever “fáceis histórias”, mas mulheres inteligentes utilizaram estrategicamente essa mídia para pôr em prática seus projetos políticos e culturais, atuando como intelectuais mediadoras (Gomes e Hansen, 2016).
Patrícia Santos Hansen: Possui doutorado em História Social pela Universidade de São Paulo. É investigadora integrada do CHAM-Centro de Humanidades da Universidade Nova de Lisboa, membro da International Federation for Public History (IFPH) e da International Research Society for Children's Literature (IRSCL). Lecionou na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro e na Universidade de Lisboa. Foi Marie Curie Fellow no Instituto de Educação (IEUL) e investigadora visitante no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS) com bolsa de cientista convidado da Fundação para a Ciência e Tecnologia de Portugal (FCT). Realizou pós-doutorado no Centro de Pesquisa e Documentação em História Contemporânea do Brasil (CPDOC-FGV) com o apoio do Programa Nacional de Apoio ao Pós-Doutorado da CAPES/FAPERJ e na Fundação Casa de Rui Barbosa com uma bolsa de pós-doutorado sênior da FAPERJ. É co-organizadora do livro Intelectuais mediadores: práticas culturais e ação política que ganhou o Prêmio Literário Sérgio Buarque de Hollanda da Biblioteca Nacional na categoria «Ensaio Social», em 2017. Tem pesquisas e publicações sobre história da historiografia e ensino de história, história e patrimônio do livro e da leitura, com ênfase na literatura infantil e intelectuais, com projetos políticos de mediação cultural. Tem interesses de investigação e ensino nas áreas da história intelectual e do gênero, história pública e metodologias de pesquisa e ensino de história.
«O jogo da paixão em O Mestre e a paixão do jogo na obra visual de Ana Hatherly», por Patrícia Silva (Universidade de Coimbra), 27 de Fevereiro de 2020
Proponho examinar O Mestre (1963), de Ana Hatherly, como narrativa exemplar da ‘desconstrução do discurso oficial’ da tradição subjacente ao movimento contemporâneo de poesia portuguesa experimental (PO.EX.), como postulado pela própria Hatherly e por Ernesto M. M. Castro (Castro, 1995, p. 59). Considerarei a forma como esse texto opera a desconstrução de topoi de narrativas experienciais de maturação e aprendizagem (bildung) e de aprendizagem do amor (Ars amatoria) da tradição ficcional e poética ocidental e de convenções ficcionais relativas a questões de género literário, enredo e focalização. Adicionalmente, arguirei que Hatherly convoca uma tradição específica de género literário e identitário da literatura e cultura portuguesas, nomeadamente a narrativa com enfoque sentimental no feminino – evocando obras e personagens tais como Menina e Moça ou as Cartas de Mariana Alcoforado –, com o intuito de estabelecer uma genealogia textual genérica para O Mestre, que por sua vez, problematiza as convenções genéricas e identitárias associadas a essa tradição. Finalmente, articularei a metáfora do jogo da paixão na novela com instâncias da paixão do jogo materializada em obras visuais da artista como exercícios de desconstrução do próprio discurso enquanto construção linguística.
Patrícia Silva: É Investigadora no Centro de Estudos Sociais (CES) da Universidade de Coimbra, onde desenvolve investigação sobre o Modernismo como fenómeno transcultural, com incidência em redes, trânsitos e trocas no contexto de movimentos literários e artísticos Portugueses e Brasileiros da primeira metade do século XX e a sua receção de e por movimentos de outras tradições linguísticas e culturais. Os seus principais interesses de investigação consistem em Estudos Culturais, Estudos Lusófonos, Literatura Comparada, Interartes e Culturas Visuais. Patrícia é doutorada em Estudos Portugueses e Brasileiros pelo King’s College London, foi investigadora visitante na School of Advanced Studies, University of London, e lecionou língua portuguesa e literaturas lusófonas na Universidade de Cambridge e em University College London. É autora de Yeats and Pessoa: Parallel Poetic Styles (2010) e tem artigos publicados nas revistas científicas Colóquio-Letras, Pessoa Plural, Portuguese Studies, Portuguese Literary & Cultural Studies e Comparative Critical Studies. Co-editou, com Steffen Dix, o número especial de Pessoa Plural intitulado “Modernismos portugueses 1915-1917: Contextos, Facetas e Legados da Geração Orpheu” (2017).
Devido às medidas de prevenção do COVID-19, as restantes sessões programadas para o III Ciclo foram integradas no IV Ciclo (2019-2020).